Se você tem um minimercado, talvez tenha começado seu negócio com um CNPJ de Microempreendedor Individual (MEI). E tudo bem; isso é bastante comum. O MEI é um excelente ponto de partida: simplificado, barato, com obrigações mais leves e uma carga tributária que parece um respiro no início. Mas deixa eu te contar uma coisa que tenho repetido muito para quem trabalha nesse segmento: quem empreende em minimercado não pode pensar como MEI para sempre.
Vamos começar com a base da conversa: o MEI tem limites. E esses limites foram pensados para negócios muito pequenos, com movimentação modesta. O teto de faturamento atual é de R$ 81 mil por ano, o que dá em média R$ 6.750 por mês. Mas, sejamos realistas: um minimercado que se propõe a crescer e atender bem o condomínio ou a empresa em que ele está, dificilmente consegue se manter abaixo desse valor por muito tempo.
Isso significa que, mesmo sem perceber, você ultrapassará o teto. E nesse ponto, ou se desenquadra e migra para ME (Microempresa), ou entra no radar da fiscalização da Receita Federal.
Aliás, muitas vezes o MEI “se engana” acreditando que está dentro do limite porque olha só o que se passa na conta bancária. Mas a Receita Federal cruza dados, inclusive de emissão de notas de quem fornece para você e, claro, de quem compra o seus produtos… E um minimercado naturalmente tem movimentações transparentes via cartão.
Não é só faturamento, é estrutura
Quando a gente fala de migrar do MEI para uma ME, muita gente se assusta. “Mas aí eu vou pagar muito imposto! E se não der certo?” Mas a realidade é que crescer pede estratégia.
Vamos colocar na ponta do lápis: um minimercado que vende arroz, feijão e outros itens de giro rápido, com preços competitivos, pode faturar bem acima do limite do MEI. Sem contar que precisa emitir notas fiscais, controlar estoque, fazer compras recorrentes, operar com maquininhas, e talvez até já tenha pessoas trabalhando para você (lembrando que só pode ter uma se for MEI), etc. Isso exige uma empresa estruturada e, consequentemente, uma estrutura fiscal adequada.
E você pode estar na correria comprando mercadoria, organizando prateleira, tentando fazer o caixa fechar no fim do mês. A última coisa em que pensa é no desenquadramento do regime. Mas isso não impede que a Receita Federal pense por você.
E quando ela pensa, vem cobrança retroativa, com juros, multa, e até o risco de perder o CNPJ. Por isso, minha sugestão sempre é: não espere o problema bater na sua porta, antecipe-se!
Migrar pode ser mais leve do que parece
A grande virada de chave acontece quando você entende que migrar para ME (Microempresa) não significa perder dinheiro; pelo contrário, pode ser o passo que lhe falta para lucrar mais.
Eu explico: ao migrar para o Simples Nacional, por exemplo, a empresa passa a ter acesso a outras faixas de tributação. E, dependendo do tipo de produto que você vende e da forma como organiza seu faturamento, é possível enquadrar produtos com NCM que oferecem alíquotas menores de imposto, reduzindo sua carga tributária legalmente.
Produtos como refrigerantes, salgadinhos, bolachas e outros itens industrializados podem ter redução tributária significativa com o uso correto do NCM. E isso, no fim do mês, representa muito no lucro.
Uma empresa no Simples pode emitir nota fiscal com mais liberdade, contar com uma equipe maior, ter conta PJ mais completa, encontrar crédito com juros menores e, evidentemente, ficar em dia com as obrigações fiscais, evitando surpresas desagradáveis.
Pensar grande exige ação estratégica
Muita gente acha que pensar como empresa grande só é necessário quando tiver cinco unidades, contratar 20 pessoas ou faturar milhões. Mas, na realidade, pensar grande começa quando você decide não agir informalmente. E isso vale mesmo para minimercados.
A profissionalização da gestão começa pela regularidade. Pela escolha do regime certo. Pela emissão correta das notas fiscais. E, principalmente, em relação aos minimercados, pela consciência de que crescer exige planejamento tributário para varejo alimentar e postura empresarial.
Depois que você migra, novas possibilidades se abrem. Você pode trabalhar com combos promocionais para melhorar suas margens de lucro, aproveitando estratégias que aumentam o ticket médio sem elevar os custos, por exemplo.
Também é interessante utilizar sistemas integrados para emissão de nota fiscal e controle de estoque, o que traz mais organização e precisão para o dia a dia do negócio.
Com um escritório de contabilidade ao seu lado você passa a ter orientações estratégicas na tomada de decisões, garantindo mais segurança e assertividade. É viável, ainda, aproveitar incentivos tributários específicos do setor, que muitas vezes passam despercebidos por quem ainda opera como MEI, ou não tem um suporte especialista.
“E se eu não migrar agora?”
Essa é outra pergunta que escuto com frequência. Tem quem prefira “esperar mais um pouco”, ou só pensar em migrar quando tiver obrigação. Porém, deixar para depois é o mesmo que andar na corda bamba: o negócio está crescendo, a fiscalização da Receita Federal está cada vez mais digital e integrada, e basta um detalhe fora do lugar para vir uma notificação e você perder a paz.
Sem contar a retroatividade: quando o desenquadramento acontece por ultrapassagem do limite, ele vale a partir do mês seguinte ao excesso, e não do momento em que você toma a decisão de mudar. Isso pode gerar cobrança de tributos retroativos com multa e juros.
“Mas se eu migrar, vai doer no bolso?”
Esse medo é clássico e compreensível. A resposta, no entanto, é: depende da forma como você se organiza e do apoio que tem.
É verdade que, ao migrar, o valor do imposto aumenta em relação ao MEI. Mas veja: o MEI é um regime extremamente simplificado, com uma carga irreal para um negócio estruturado como um minimercado. Não dá para comparar alface com laranja, certo?
Ao passar para uma ME no Simples Nacional, o imposto é calculado sobre a receita bruta, e a alíquota inicial pode variar entre 4% e 11%, dependendo da atividade e do anexo em que se enquadra.
A boa notícia é que, com um planejamento tributário para varejo alimentar inteligente, é possível reduzir essa alíquota na prática, principalmente com a correta classificação fiscal dos produtos, uso de NCMs favoráveis e controle de margem de lucro.
Muitas pessoas se concentram demais no valor do imposto e esquece de olhar para o lucro líquido do negócio. E esse é um erro que pode travar o crescimento. Em vez de perguntar “quanto vou pagar?”, o ideal é perguntar: “quanto vai sobrar no fim do mês se eu tiver tudo regularizado, com menos risco e mais controle?”
Migrar para ME permite organizar melhor o financeiro, ter clareza de margem por produto, estruturar promoções com combos lucrativos, controlar o estoque de forma inteligente e até negociar melhor com quem fornece para o seu negócio. Ou seja: você ganha poder de gestão. E quem tem poder de gestão, lucra mais.
Comparativo: MEI x ME no cenário de um Minimercado
| Descrição | MEI | ME (Simples Nacional – Comércio) |
| Faturamento mensal | R$ 6.750,00 | R$ 30.000,00 |
| Faturamento anual | R$ 81.000,00 (teto MEI) | R$ 360.000,00 (exemplo abaixo do Anexo I) |
| Tributação | DAS fixo (R$ 76,90/mês) | Alíquota inicial de 4% sobre faturamento |
| Impostos pagos no ano | R$ 840,00 | R$ 14.400,00 |
| Margem de lucro estimada | 20% | 20% |
| Lucro anual (estimado) | R$ 16.200,00 | R$ 57.600,00 |
| Possibilidade de emitir NF | Limitada (obrigatório para vendas a PJ) | Completa |
| Controle de estoque/sistemas | Geralmente manual ou planilhas | Pode integrar com ERP, PDV, estoque |
| Acesso a crédito e expansão | Limitado | Facilitado, com mais opções bancárias |
| Risco de desenquadramento | Alto ao ultrapassar o teto sem perceber | Não há teto fixo tão restritivo |
Em suma, ao mesmo tempo em que o MEI oferece simplicidade, ele também impõe um teto rígido que vai limitar o seu crescimento.
No exemplo acima, mesmo com uma carga tributária maior, o empreendedor que atua como ME consegue multiplicar o faturamento sem violar regras fiscais e ainda ampliar o lucro líquido em mais de 250% ao longo do ano. Isso ocorre porque o volume de vendas compensa a tributação e permite escalabilidade com segurança jurídica e contábil.
A vantagem invisível: Tranquilidade
Tem um benefício que pouca gente considera, mas que faz muita diferença no dia a dia: a tranquilidade. Empreender no Brasil já é desafiador, mas fazer isso com medo constante de uma fiscalização da Receita Federal, ou com a incerteza de estar ou não dentro da legalidade, só aumenta o estresse e compromete a sua saúde mental.
Ao se formalizar corretamente, migrar para o regime ideal e ter um suporte contábil especializado, você tira um peso enorme das costas. Dorme melhor, planeja com mais segurança e pode até delegar tarefas com mais tranquilidade. E isso, convenhamos, não tem preço.
Mais um ponto que não pode ser ignorado: minimercados têm muitas particularidades, como o sortimento de produtos, cada um com um NCM diferente, margem apertada, giro rápido de estoque e obrigações fiscais específicas, inclusive estaduais e municipais. Então, meu principal conselho, embora esteja só aqui no fim no meu artigo, é que você prefira o suporte profissional de contadores especialistas no setor supermercadista.
O ideal é ter ao lado uma contabilidade que entenda do seu segmento. Que fale a sua língua, que saiba como aplicar a melhor classificação fiscal para seus produtos, que ofereça estratégias reais para redução de impostos sem sair da legalidade e que conheça o ritmo do seu dia a dia.
O primeiro passo é olhar para os números com clareza. O segundo é buscar orientação com quem entende do assunto. E o terceiro é agir com estratégia.
Afinal, se o seu minimercado cresceu, sua mentalidade também precisa crescer. O MEI é ótimo para começar, mas não foi feito para sustentar um minimercado em expansão como o seu.
Especialista em Direito Tributário pela PUC-Campinas, atuando há quase duas décadas em consultoria e planejamento tributário. Advogado (PUC-Campinas), bacharel em Ciências Contábeis (PUC-Campinas), e técnico em Processamento de Dados (Unicamp), combina expertise em tecnologia e legislação para soluções fiscais estratégicas. É sócio-diretor da Classe A Contábil, sócio da Plano A Gestão Financeira, e head na Pedi, Tordin & Domingues - Advogados Associados.
